
Professora, apresentadora de TV, esposa, mãe, dona-de-casa e assassina nas horas vagas.
Como todo cidadão “responsável”, procuro manter minhas dívidas e meus documentos em ordem. Tirei a última segunda-feira para cuidar disso. Comecei o dia organizando a papelada. Fui de um banco para outro sacando, depositando, pagando e... Ufa! Tudo em ordem. Depois me dirigi à auto-escola para acertar os detalhes da renovação de minha CNH (Carteira de motorista). Tudo acertado fui ao médico para o exame.
TCHAN, TCHAN, TCHAN, TCHAN!
Depois de tudo feito a doutora me deu um meigo sorriso e disse que não poderia renovar minha carteira pelo prazo de cinco anos, como de costume. Ela atestou uma renovação por apenas um ano. Porque eu sou GORDA! Segundo ela, os obesos mórbidos (denominação técnica para gente balofa) representam um perigo para a população, pois correm o risco de sofrer um infarto enquanto dirigem e matar quem está na rua no momento infeliz. Há também o risco de dormir ao volante, não ser ágil o suficiente para fazer as manobras necessárias e não girar a cabeça o bastante para ver a paisagem. Ela me deu o prazo de um ano para resolver esse problema, ou seja, emagrecer. Sugeriu uma redução do estômago e ficou surpresa de que nenhum médico tenha feito essa indicação anteriormente.
Sai do consultório, literalmente, sem direção.
Procurei meus direitos e descobri que a lei EXISTE! Motoristas gordos, mesmo com anos de experiência e nenhum delito, como eu, perderão sua licença para dirigir caso não reduzam o peso.
Acredito que além do bafômetro a polícia rodoviária, a partir de agora, deverá ser equipada com balanças.
As estradas ganharão nova sinalização:
Cuidado! Restaurante a 500 metros, pode haver um gordo se abastecendo.
Acredito que a população deva ser alertada através de campanhas:
“Se comer não dirija. Se for dirigir não coma”.
“Papai, não coma”.
“Use cinto de segurança na boca”.
Sei que a obesidade é um problema e pode causar danos, mas nunca pensei que sendo gorda poderia fazer mal a alguém. Sinto-me um monstro. Uma assassina em potencial. Capaz de matar inocentes. Criancinhas a caminho da escola, idosos à espera do ônibus, trabalhadores. Sou uma pessoa perigosa. Uma pessoa FORA-DA-LEI.
Agora sei por que a Rodovia Fernão Dias está desabando. Foi aquele curso que eu fiz em São Paulo. Maldita Yakissoba.
O que me incomoda realmente é que ninguém pode prever que um garotão vai pegar o carro do papi e disputar um racha. Ou que um sujeito vai sair na contramão a toda velocidade porque perdeu o emprego ou brigou com a namorada. Mas basta olhar para um gordo para saber que ele vai dormir ao volante. A gostosona que passa o dia comendo gelo com alface para ser modelo também corre o risco de desmaiar ao volante, mas só o gordo FAZ MERDA.
Não me incomodaria passar por uma bateria de exames para saber minhas reais condições, mas não poder dirigir baseada na “possibilidade” de acontecer algo? A Bíblia diz que o futuro pertence a Deus. Como todo médico pensa que é deus, além de fazer diagnósticos, agora também fazem previsões. Esqueci de perguntar o número da próxima mega sena.
A palavra do momento é INCLUSÃO. Projetos e mais projetos do governo em favor do direito de ser diferente. Não é fácil para mim, como professora, falar de inclusão daqui para frente sabendo que faço parte dos EXCLUÍDOS.
Acredito na boa vontade da doutora e vou cumprir a lei. Na segunda-feira mesmo comecei mais uma dieta (Pelé fez mil gols e eu vou completar mil regimes). Mas gostaria de acreditar que, pensando na segurança da população, além de proibir os gordos de pegar no volante, o governo irá também melhorar as condições das estradas brasileiras. Afinal, não é preciso ser médico ou vidente para prever acidentes em estradas esburacadas, mal sinalizadas e sem acostamento. Outra determinação que espero encontrar na lei é a proibição de médicos dirigirem após plantões de 24 horas onde, supostamente, passam 24 horas trabalhando e por isso, correm mais risco de dormir ao volante que qualquer obeso.Eu não sou o único monstro desta história.
“MOTORISTA, RESPEITE A VIDA. NÃO ULTRAPASSE OS 80 K (quilos)”
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